quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

NEUROSE DE IMAGEM

É de  Paul Tillich a definição de "neurótico" mais apropriada que já li: "O neurótico é aquele que, tentando evitar o não-ser, evita o ser." De fato, o estancamento é a característica mais acentuada da neurose. Por medo de ser quem realmente é,  o sujeito assume uma caricatura; e quem assume uma máscara por muito tempo, cola-se a ela e se descaracteriza, vira um mero personagem em busca de aplausos da audiência.

        Tenho fortes razões para pensar numa derivação importante de neurose, a que chamo de  "neurose de imagem." É uma versão piorada do narcisismo freudiano porque, além de mergulhar na própria imagem, por se encantar com o próprio reflexo, o neurótico de imagem deriva sua autofascinação do espelho popular a quem constantemente recorre: "Espelho meu, espelho meu, diga se existe alguém mais fascinante do que eu." Não é que o espelho minta, necessariamente, mas é que só vê a pele, as cores da casca. 

        Na verdade, líder neurótico de imagem,  e o espelho popular se completam e necessitam um do outro. O líder precisa da aprovação popular para manter sua autoimagem, no caso, heteroimagem, em alta. A massa liderada, por sua vez, precisa de alguém que dependa de sua aprovação, que acate seu parecer de virtude e "performance."

       A autoestima da massa, também depende da imagem que seu líder neurótico tem no mercado externo, para que ela possa se sentir bem-sucedida. Por exemplo, muitas igrejas se sentem grandemente recompensadas quando seu líder é bem situado no ranking dos conferencistas de peso. Isso dá à coletividade a sensação de sucesso, através do nome de seu líder. Muitas vezes, porém, à custa de desarrumação e descuido interno. 

      Essa é, talvez, a mais complicada forma de neurose interposta entre o líder e seus liderados, pois, além de ser sutil, vicia. Sutil porque não dói, não machuca na superfície, não gera desprazer. Vai chegando de mansinho, se instala e vai dominando, cada vez mais forte, a cada sessão de aplausos. Vicia, porque produz uma satisfação capaz de gerar demanda de repetição, produzindo uma dependência tão forte que aplausos e elogios acabam sendo buscados como indutores de prazer, pílulas de satisfação. 

      A neurose de imagem é uma enfermidade emocional própria de personalidades públicas, líderes de massa: pastores, professores, padres, políticos, entre outros profissionais de palco, tendem a sofrer desse mal. Alguns, inclusive, caem em depressão quando não despertam resposta elogiosa do "fã clube"; e outros podem até surtar, mesmo que temporariamente, quando vaiados.

       Algumas características do neurótico do líder que sofre da neurose de imagem são:
                                                 
1.  Competência. É normalmente uma pessoa que chama a atenção por  sua capacidade de superfície. Mesmo que por dentro ela seja insegura, quase sempre faz um trabalho bem feito, em muitos casos, bem acima da média. É alguém de quem as audiências costumam falar bem, elogiar, mimar, agradar e solicitar.

2. Perfeccionismo. Esse tipo de neurótico exige demais de si e, em geral, dos outros que fazem parte de seu projeto público, pois, se eles falham, sua imagem é arranhada. Imagem arranhada é sua fobia  mais forte. Por exemplo, um pastor-pai pode tiranizar seus filhos para que eles não sejam "mal falados" na igreja, às vezes,  por serem apenas iguais a todos as demais crianças e adolescentes.

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